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Dificuldades

Dispara pedido de recuperação judicial por produtor rural

Perdas nas lavouras e aumento de custos levaram à alta de 300% nos requerimentos

Rural | 07 de Fevereiro de 2024 as 08h 05min
Fonte: Globo Rural

Foto: Divulgação

Os pedidos de recuperação judicial por produtores rurais dispararam no Brasil no ano passado, reflexo, sobretudo, das dificuldades financeiras por conta da alta de custos e de perdas nas lavouras afetadas por intempéries. E a expectativa é que esse recurso continue em alta em 2024.

Foram 80 pedidos entre janeiro e setembro de 2023, segundo os dados mais recentes da Serasa Experian. Em comparação a todo o ano de 2022, quando houve 20 pedidos, a alta foi de 300%. Os produtores rurais são a única categoria de pessoa física que pode recorrer a essa alternativa, dado o alto nível de risco da atividade.

O agricultor Junior Diehl foi um deles. Ele viu o desequilíbrio de suas dívidas após uma quebra de safra que o levou a recorrer ao instrumento. Diehl acredita que, nesta temporada, muitos produtores de Mato Grosso devam atravessar dificuldades semelhantes. O motivo é a combinação entre patamar ainda alto de custo com insumos, queda no preço da soja e condição climática adversa.

“Cerca de 20% a 30% dos produtores do Estado, hoje, estão se encaminhando para o mesmo problema que a gente teve. Se não entrasse em recuperação judicial, eu ia perder tudo”, afirma o produtor em entrevista à Globo Rural.

 — Foto: Globo Rural

— Foto: Globo Rural

O ano de 2018 foi o estopim para o endividamento de Diehl. Primeiramente, pela alta de preço de insumos em decorrência da greve dos caminhoneiros. Em seguida, a região em que está sua propriedade, o Vale do Araguaia (MT), teve seca durante a safra e chuva na colheita, o que fez boa parte da produção apodrecer.

No início de 2019, o grupo Diehl ainda cultivava mais de 11 mil hectares de soja, milho, feijão, arroz e gergelim. Porém, uma parcela das terras precisou ser vendida e no ciclo atual a área se restringe a 4 mil hectares. “Tentei negociar com banco, pedi dois anos de carência e não consegui”, relata.

Então, no ano passado, a 4ª Vara Cível de Rondonópolis (MT) acatou o pedido de recuperação judicial do grupo Diehl e seus integrantes pessoa física, como Junior. O passivo era de R$ 132,5 milhões, sendo que a dívida concursal — incluída na recuperação — é de R$ 111 milhões.

O plano de recuperação judicial já foi montado e agora está em negociação com os credores. “Precisamos que 50% mais 1 dos credores aprovem o plano. Acredito que até maio teremos superado essa etapa”, diz o advogado de Diehl, Rubem Vandoni, sócio da RJV Advogados.

Vandoni afirma que a recuperação judicial evita que o produtor perca bens que são necessários para que ele permaneça na atividade e possa pagar as contas, como a fazenda, maquinário agrícola e a própria produção. Esses bens, em geral, estariam em risco entre as garantias das dívidas.

No quadro geral de recuperações judiciais requeridas em todo o ano de 2023 no país — considerando empresas do comércio, indústria, serviços e setor primário — foram 1.405 pedidos, um aumento de quase 70% em relação a 2022.

“Acreditamos que o principal fator para este avanço no agro foi a alteração na legislação, que mudou em 2020 e passou a permitir que os produtores pudessem pedir recuperação judicial. A maior parte dos pedidos foi em Mato Grosso, em áreas de soja e pastagem, mas a gente acha que esse número ainda não se estabilizou. Neste primeiro momento, vai acabar subindo”, afirma, em entrevista ao Valor o head de Ciência de Dados para o Agronegócio da Serasa Experian, Frederico Poleto.

Mas não é só isso. Na avaliação do especialista Luiz Deoclécio Fiore de Oliveira, presidente da OnBehalf Auditores e Consultores, a alta nos pedidos reflete tanto uma demanda represada, já que é uma possibilidade recente, quanto o contexto econômico enfrentado pelo setor.

“Por mais que exista uma visão de que o agro tem uma participação relevante no PIB [Produto Interno Bruto], esse é um setor que tem desafios diferentes de outros segmentos. Ele depende de ter um equilíbrio climático, uma estabilização no preço dos insumos e de ter uma política de governo que o apoie”, afirma. Oliveira atende cinco empresas do agronegócio com pedidos de recuperação entre seus 60 clientes.

 

Desafios da lavoura

Além das particularidades do agro, o último ano foi complexo para os produtores rurais no que diz respeito ao clima, por causa dos impactos do El Niño sobre as lavouras. A volatilidade nos preços dos insumos, como fertilizantes, devido a questões geopolíticas, também os afetou.

“O custo operacional aumentou muito e tudo isso se reflete no agravamento da atividade empresarial ou mesmo da produção rural. Por isso a gente entende que essas dificuldades ainda vão desencadear um agravamento ao setor”, avalia Oliveira.

Por essa razão, ele acredita que 2024 deve ser outro ano de aumento nos pedidos de recuperação judicial por produtores, podendo até superar a alta de 300%, considerando os dados de nove meses de 2023. “Isso deve ocorrer até mesmo pelo amadurecimento da legislação (...) e também pela quantidade de produtores rurais pessoa física que existem no Brasil, que são muitos”, enfatiza.

Guilherme Bechara, sócio da área de reestruturação e falência do Demarest, também avalia que os pedidos de recuperação judicial no setor devem crescer este ano, devido sobretudo aos pedidos de pequenos e médios produtores rurais.

“O crédito ficou mais caro para todo mundo e houve um grande problema do aumento de custo, principalmente dos insumos, dos fertilizantes, com a guerra da Rússia e Ucrânia”, afirma. (Colaborou Marcela Villar, de São Paulo)