Especial aniversário Sinop
Anos 80: exercitando a democracia e a civilidade
Na década de 80 Sinop fez política, viu a comunicação chegar e o sonho do etanol evaporar
Política | 13 de Setembro de 2025 as 00h 12min
Fonte: Jamerson Miléski

Ao longo da década de 80 Sinop vai deixando de ser um sítio no meio da floresta Amazônica para ganhar contornos de cidade. A infraestrutura urbana avança e a população começa ter acesso a serviços tanto públicos quanto privados, comunicação e a construção da sua identidade democrática, com o advento das eleições diretas e o surgimento de diversas entidades de classe que norteariam a sociedade civil organizada.
O censo realizado pelo Governo Militar apontava uma população de 12.232 em Sinop no ano de 1980. Apesar da baixa contagem populacional, a Caixa Econômica Federal abre sua primeira agência na cidade.
No dia 3 julho de 1980, Sinop recebe pela primeira vez a visita de um presidente da República. O general João Batista Figueiredo aterrissa na cidade com um avião da FAB (Força Aérea Brasileira) e é recepcionado por uma comitiva de sinopenses entusiasmados. Foi nesse dia que se realizou a emblemática acolhida dos lenços brancos: as mulheres da cidade acenavam para o presidente empunhando pequenos pedaços de tecido. O gesto foi uma forma pacífica de pedir ao presidente militar a ligação das linhas telefônicas em Sinop bem como a transmissão de sinal de televisão. Narra a história que as mulheres queriam poder assistir as novelas, afim de ter um entretenimento em seus lares.
Figueiredo também vai acompanhar a implantação da Sinop Agroquímica, onde faz um memorável discurso que versa sobre o assertivo plano de interiorizar o Brasil e da sua postura como presidente em priorizar os investimentos em agricultura, ressaltando que a partir de agora a região precisava de energia e transporte para catapultar sua produção. O ponto alto da fala presidencial talvez seja esse trecho: “Hoje vejo aqui, com a maior satisfação, que a terra está dada aos que trabalha nela e nela produzem. Hoje estou vendo aqui nasceu uma comunidade. Eu quisera viver 15 anos mais para voltar e testemunhar o que será esta comunidade”, entoou Figueiredo.
O presidente viveu mais 19 anos depois daquela visita, morrendo em 1999, aos 81 anos de idade. Sua projeção estava correta quanto a vocação econômica da região, mas não quanto ao tempo. Os avanços significativos na produção agrícola demoraram uma década a mais do que o previsto pelo presidente, justamente pela mora no avanço da logística e da energia.
Durante toda a época de 80, o que balizou a economia de Sinop foram as indústrias madeireiras. O município ficou nacionalmente conhecido pela sua produção madeireira. Quando Ênio Pipino e João Pedro Moreira de Carvalho começaram a projetar a colonização da Gleba Celeste, uma das preocupações era estabelecer um lugar atrativo para madeireiros do Paraná que estavam migrando para o Paraguai em busca de matéria prima. Nesse sentido, o plano deu certo. Sinop recebeu uma leva de empreendedores que encontraram dificuldades no país vizinho. O setor madeireiro já estava tão sólido em 1980, que surge a primeira organização patronal, a AMIN (Associação dos Madeireiros do Interior de Mato Grosso).
Os lenços e luvas brancas tocaram o coração do general presidente. Três meses após a visita foi instalado em Sinop a Radiobrás, operando com uma rádio FM. Até então, toda a comunicação com a população era feita através da “Voz do Progresso”, um velho autofalante fixado em um poste na área central da cidade que divulgava notícias e informes a população. Com o sinal de rádio, o equipamento foi aposentado.
Em 1981 a rede de telefonia chega à cidade. Antes disso, para fazer uma ligação era preciso se deslocar até Cuiabá. Aparelhos de rádio amador, um deles instalados na sede da Colonizadora Sinop, eram uma alternativa da comunicação. No mesmo período iniciou-se a transmissão do sinal de televisão, mas ao invés da aguardada novela, as mulheres da cidade tiveram que se contentar com uma série de “programas enlatados” (pré-gravados), repetidos a exaustão. Uma memória dos sinopenses desse período é o filme “O Homem que Derreteu”, que estava no pacote de enlatados e foi transmitido pelo sinal repetidas vezes.
Entusiasmados com a obra da Sinop Agroquímica, agricultores da região enchiam o solo de ramas de mandioca. O governo federal financiava a produção, com empréstimos que seriam quitados com a colheita. A ação ficou popularmente conhecida como “Plante que o João garante” – João, no caso era o presidente da República João Figueiredo. Em 1981, cerca de 150 mil toneladas de mandioca foram entregues na conta do “João”. O produto recebido pelo Banco do Brasil era destinado a usina de etanol, que naquele ano era movimentada por 250 empregados. O álcool produzido em Sinop foi comercializado no Sul do país para fabricação de bebidas e como componente diluente da gasolina. A dificuldade de logística e a variação nos preços, que deixavam uma margem estreita demais para os produtores, prenunciavam o fracasso da indústria.
Ainda em 1981, Ênio Pipino manda o primeiro ofício para o reitor da UFMT (Universidade Federal de Mato Grosso), pedindo a instalação de um núcleo de pedagogia em Sinop. Foi a primeira movimentação para fazer da cidade um eixo universitário. Uma série de ações em sequência ao longo de três décadas consolidariam o município como um polo educacional.
Foi também em janeiro 1981 que começou a história da democracia de Sinop. O governador Frederico Campos nomeou Oswaldo de Paula como primeiro administrador do município, emancipado em 1979. Cabia ao comerciante pioneiro instalar a prefeitura e preparar Sinop para a primeira eleição, marcada para 1982.
Na primeira vez que os sinopenses votaram, nas velhas urnas de malote onde se depositava o voto impresso, 4 nomes estavam disponíveis para assinalar no campo de prefeito: Ari Daher, Geraldino Dal Maso, Sebastião de Matos ou Vasco de Medeiros. Dois candidatos do PDS e dois do PMDB. Em novembro de 1982, Sinop tinha 10.741 eleitores registrados em Sinop – apenas 2 mil a menos do que o registrado no total da população no Censo de 1980. Destes, 8.212 compareceram para votar, sendo que 5.094 votaram no PDS e 2.482 no PMDB. Com mais votos, Geraldino Dal Maso foi o escolhido. O pioneiro foi o nome defendido por Ênio Pipino, sempre muito presente na cidade e na política local. Mas também se consolidava o primeiro grupo de oposição, com a eleição da primeira Câmara de vereadores de Sinop, presidida por Waldemar Brandão, comerciante e patrão do CTG Porteira da Amazônia – que acabou extinto, convertido em um clube de piscinas que teve o mesmo fim.
É no ano do pleito que a sociedade civil organizada eclode. Em maio é implantada a diocese de Sinop, liderada pelo Bispo Dom Henrique Fröenlich. Ao longo do ano é fundado o primeiro Rotary Clube de Sinop.
Em 1983 é fundada a CDL (Câmara dos Dirigentes Lojistas), entidade de representação e promoção do comércio que se tornou uma das mais expressivas de Sinop a partir dos anos 2000. A gestão municipal eleita constrói a primeira sede da Câmara de Vereadores. No campo, mais de 500 propriedades plantavam 4,3 mil hectares de mandioca – a maior parte pertencente a própria usina. Açoitado pelos preços pagos por “João” e com suas dívidas crescendo com os altos juros que tentavam conter a inflação, os pequenos produtores migravam para outras culturas. Destaque para a produção de pimenta do reino. A Comicel comprou naquele ano 63 toneladas da especiaria. Mas a logística continuava sendo um entrave.
No aniversário da primeira década de fundação, em 1984, foi o ano onde quase tudo aconteceu em Sinop. O calendário começa com a morte da “Mãe Fundadora”, Nilza de Oliveira Pipino. No dia 20 de fevereiro de 1984, em um voo privado que decolou de Maringá (PR). O avião onde estava Nilza cai 500 metros à frente da cabeceira da pista. O piloto e um juiz de direito que estavam na aeronave morrem na hora. Nilza sai gravemente ferida e morre dois dias depois. Ênio e a esposa do juiz que estavam no voo tem ferimentos leves. O acidente foi no mesmo final de semana que um grande grupo de pessoas foi até a Praça Alencastro em Cuiabá em um ato pelas Diretas Já – pedindo a volta das eleições diretas, que não ocorriam desde o Golpe de 1964.
A inquietação política da capital contrastava com a parestesia da colônia amiga dos generais. A subordinação política ganha um exemplo palpável quando o então governador Júlio Campos traz a primeira obra de asfalto urbano de Sinop. Pela pavimentação, de baixíssima qualidade, em 5 quadras na Avenida dos Mognos, a principal da cidade, o governador foi homenageado com toda a via, que passou a se chamar Avenida Júlio Campos.
O grupo de oposição, liderado por Waldemar Brandão, chega a ensaiar um protesto contra o presidente militar João Figueiredo, que faria sua segunda visita a Sinop para inaugurar a pavimentação da BR-163. O movimento é diluído após uma reunião com o colonizador Ênio Pipino, que convence os presentes a “pedir ao invés de ofender”. Figueiredo faz a sua segunda visita a Sinop para inaugurar o asfalto da rodovia federal, que chegava até a frente da Sinop Agroquímica. Agora o Restaurante O Colonial, construído para receber chefes de Estado, já está pronto. No dia 6 de dezembro de 1984, Figueiredo faz um discurso de improviso, comparando a colonização do Norte de Mato Grosso com a jornada feita pelos portugueses para colonizar o Brasil. A fala tem um tom de despedida, de um governo militar que caminha para o fim, mas que pontua experiências como a de Sinop na conta dos acertos. “Essa recepção muito me emocionou; eu digo aos mato-grossenses de Sinop que valeu a pena. Valeu a pena porque só assim eu pude presenciar essa nova descoberta do Brasil. E posso deixar o Governo na certeza de que antes de eu morrer hei de ver esta terra com seu povo feliz e, quanto aos demais brasileiros, um pouco do produto do seu trabalho. Repito aos senhores que valeu a pena, apesar da idade e do sofrimento desses 6 anos, eu digo aos senhores que só por isso eu seria capaz de repetir tudo de novo”, diz trecho do pronunciamento arquivado na Biblioteca da Presidência da República. Figueiredo deixou o cargo em março do ano seguinte, não com eleições diretas, que só viriam a acontecer em 1989.
Ainda em 1984 é realizada em Sinop a primeira Exponop, uma feira agropecuária da cidade que se torna tradicional. Ainda no mesmo ano é criada a comarca de Sinop, tendo como primeiro juiz Antonio Paulo da Costa Carvalho e o primeiro promotor público, Hélio Fridolino Faust. É em 1984 que também inicia a história do Colégio CAD, a primeira instituição de ensino privada de Sinop.
Enquanto isso o primeiro prefeito eleito de Sinop estabelece marcos importantes da cidade. Geraldino elabora o primeiro Código de Obras da cidade. É em 1985 que ele avança com um plano de drenagem, abrindo grandes valetões nas principais avenidas da cidade, que ajudam a deixar o solo menos encharcado. Nessa época Sinop era popularmente chamada de Sapolândia. Ainda em 1985, é implantada a APAE (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) e o primeiro cartório da cidade, administrado pelo oficial Osvaldo Reiners.
No campo das realizações, nada de grandioso acontece em Sinop em um intervalo de 3 anos. Uma crise na agricultura recai sobre o país em 1985. Com a pavimentação da BR-163 várias serrarias começam a se estabelecer no município. A força no setor faz a AMIN ficar obsoleta, dando lugar ao Sindusmad (Sindicato das Indústrias Madeireiras), entidade que passa a ter um grande peso nas discussões políticas, econômicas e industriais. No mesmo ano é formalizada a Acrinorte (Associação dos Criadores do Norte de Mato Grosso), que abraça a organização da Exponop nos anos seguintes. Em novembro de 86, o padre alemão Karl Manfred Thaller cria a Adestec (Associação de Desenvolvimento do Trabalho, Educação e Cultura), que anos depois será a pedra angular da Fundação de Saúde Comunitária de Sinop, que irá erguer o primeiro Hospital Filantrópico da cidade, o Santo Antônio.
No ano de 1987, a desastrosa política econômica do Governo Sarney consegue desestabilizar Sinop, provocando uma forte crise, em especial no setor madeireiro. O período crítico, mais duradouro na nação, passa em menos de um ano no Norte de Mato Grosso. A cidade começa a receber um volume grande de imigrantes a partir do final de 1987 até o começo da década de 90. Através da intermediação do Sindusmad são abertos em Sinop uma unidade do INSS e o SENAI. A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) implanta sua 6ª subseção na cidade e a gestão municipal ergue o Ginásio de Esportes Benedito Santiago, que homenageia o deputado de mesmo nome nascido em Cuiabá, mas eleito por Alta Floresta. No mesmo período são construídas as duas praças na entrada de Sinop.
O ano de 1987 se apaga junto com as caldeiras da Sinop Agroquímica. Após 6 anos em pleno funcionamento, a usina paralisa suas atividades, tentando voltar a produção em diferentes momentos, mas nunca conseguindo se manter por um longo período. A cultura da mandioca, a partir de então, encolhe, sendo dedicada exclusivamente para panela.
O “João” voltou para Sinop em 1988. Há 3 anos fora da presidência da República, o general João Batista Figueiredo foi convidado por autoridades locais – que pagaram sua passagem e estadia – para receber um Título de Cidadão Sinopense. Embora fossem os últimos dias de um Regime Militar que se estendeu por 24 anos, o presidente foi calorosamente recebido na cidade, tanto quanto nas duas vezes anteriores. Um jantar foi organizado no Restaurante O Colonial para que as pessoas pudessem ficar próximas de Figueiredo. Foram colocados à venda 400 ingressos, com preços atualmente equivalentes a R$ 2 mil por pessoa. Todos os lugares foram preenchidos e a arrecadação ajudou a Acrinorte a construir o seu Parque de Exposição para as próximas Exponop.
O ex-presidente não viu a logística ou a energia que desejava. A ligação com os portos do Norte estava longe de ser uma realidade e Sinop ainda era energizada por geradores a diesel. A agricultura tampouco despontou e a economia era basicamente a atividade madeireira. No ano da terceira visita do presidente, a Rádio Brás foi privatizada. Também pela iniciativa privada surgiu em Sinop a Rádio Gaspar AM.
Ainda em 1988, líderes locais da igreja católica em conjunto com o médico alemão Josef Wennemann abrem as discussões para implantação do hospital filantrópico.
Enquanto a nova Constituição Federal era promulgada, Sinop realizava a sua segunda eleição municipal, disputada por 3 médicos. Venceu o mais antigo, Adenir Alves Barbosa.
Em 1989 começa a treinar pelo Sinop F.C o funcionário do Banco do Brasil Rogério Ceni, com a camisa 5, jogando de volante. Após a lesão de dois goleiros do Galo do Norte ele vai catar no gol, dando início a uma carreira que o consagraria como guarda-redes do São Paulo F.C. Embora o futebol fosse popular na época, outro esporte reunia adeptos. Em 1989 é fundado o Moto Clube Sinop, que passa a promover competições de motocross, tendo como principal expoente o piloto Paulo Pan.
No aniversário de Sinop de 1989 é inaugurado o complexo olímpico José Carlos Pasa, com a realização do 1º Jogos Olímpicos – competição de várias modalidades que se torna tradicional na cidade. A gestão municipal também reforma o Estádio Pipinão, cercando a estrutura com tábuas que rebatizam a arena como “O Madeirão”. Entre a população o nome do novo estádio era “Logoão”, que ficava alagado com as chuvas.
Adenir também avança no projeto de tornar Sinop uma cidade universitária. Em 1989 a UFMT interioriza suas atividades através do programa Unestado, que traz um núcleo de ensino superior para o município, com alguns cursos.
Na parte de infraestrutura, o novo prefeito inaugura em 1989 o Parque Florestal, um dos cartões postais e modelo de preservação urbana da cidade de Sinop. No mesmo ano a avenida principal da cidade passa por uma reestruturação, recebendo asfalto e iluminação pública.
Entre as entidades de classe é fundada em 1989 a Fundação de Saúde Comunitária de Sinop e o Sindicato dos Produtores Rurais.
Sinop chega ao final da década de 80 relativamente estruturada, com a sua economia alicerçada fortemente pela madeira, mas com sua sociedade organizada, incubando projetos audaciosos para educação e saúde, mas acima de tudo exercitando o seu sentimento de comunidade.
Clique aqui para ver a História Antiga de Sinop e a década de 70.
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