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Acusado de vendas de sentenças

PF: lobista criou contatos falsos com nomes de servidores do STJ

Investigação suspeita que Andreson Gonçalves usava essa estratégia para ocultar crimes

Polícia | 10 de Outubro de 2025 as 16h 01min
Fonte: AGUIRRE TALENTO / ESTADÃO CONTEÚDO

Foto: Reprodução

O lobista Andreson de Oliveira Gonçalves, suspeito de operar um esquema de venda de decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ), criou falsos contatos em seu telefone celular com nomes atribuídos a servidores do STJ, mas que na verdade eram de advogados. A defesa do lobista não quis se manifestar sob argumento de que o caso está em sigilo.

As informações foram obtidas pela Polícia Federal por meio de um dos novos elementos de prova obtidos da Operação Sisamnes, a extração de dados da nuvem do celular de Andreson, e apresentadas no relatório parcial enviado nesta semana ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Até agora, a PF identificou que os diálogos com um dos assessores do STJ correspondiam exatamente ao nome salvo no celular do lobista: o de Márcio José Toledo Pinto, que trabalhou nos gabinetes das ministras Isabel Gallotti e Nancy Andrighi.

Sob o contato “Márcio Gallotti”, Andreson manteve diálogos com o assessor e enviou a ele comprovantes de depósito para uma da esposa dele. A PF identificou que o lobista pagou R$ 4 milhões ao assessor por meio desse esquema, em troca da obtenção de minutas de decisões.

A PF concluiu, com base nos diálogos e metadados de arquivos, que minutas de decisões das ministras Isabel Gallotti e Nancy Andrighi foram manuseadas por Márcio no sistema do STJ.

Procurada, a ministra Nancy afirmou que colocou seu gabinete à disposição para auxiliar nas apurações “a fim de que o assunto seja esclarecido e os envolvidos punidos de forma exemplar”.

“Márcio Toledo Pinto foi servidor concursado do STJ por 21 anos, lotado neste Gabinete por pouco mais de um ano e, assim que os supostos fatos delitivos foram noticiados, o funcionário foi sumariamente dispensado do Gabinete em agosto de 2024.O referido servidor foi demitido pelo STJ no ano de 2025, nos autos de processo administrativo disciplinar”, disse em nota.

A ministra Isabel Gallotti não se manifestou. A defesa de Márcio José Toledo Pinto também não comentou.

Os nomes de outros assessores no celular do lobista, entretanto, não correspondiam aos contatos salvos.

A PF aponta suspeitas de que Andreson usou outros nomes para dissimular as tratativas ilícitas com os servidores ou que usava as conversas com os nomes falsos para vender influência e cobrar para intermediar decisões judiciais.

Um dos contatos do celular do lobista tinha o nome atribuído a Daimler Alberto de Campos, que era chefe de gabinete da ministra Isabel Gallotti e era citado nominalmente em diálogos de Andreson com outros interlocutores. Daimler é um dos investigados no caso e foi afastado do cargo temporariamente por decisão do STF. A PF identificou, porém, que o contato salvo no celular do lobista na verdade correspondia a um advogado, sem relação direta com o assessor do STJ.

Por outro lado, Andreson não citava em seus diálogos ter acesso ao servidor Márcio José Toledo Pinto, apesar de este contato no seu celular corresponder exatamente a ele. Pinto também foi procurado, mas não se manifestou.

Em nota, a defesa de Daimler afirma que seu nome foi usado indevidamente pelo lobista para vender influência.

“A investigação comprova, claramente, que diversas autoridades tiveram seus nomes utilizados de forma criminosa --verdadeira venda de fumaça. O nome de nosso cliente, infelizmente, foi dragado para essa situação por essa utilização espúria de nome, pelo cargo que ocupava (chefia de gabinete). Após tantos meses de investigação, vemos apenas o óbvio: nenhum indício contra ele”, afirmou o advogado Bernardo Fenelon. A defesa diz ainda que a sindicância do STJ afastou a existência de indícios contra o servidor e disse que até o momento ele não foi chamado para prestar depoimento à PF.

A análise também apontou dois possíveis contatos falsos vinculados ao gabinete do ministro Og Fernandes. Um deles tinha o nome “Leo Gab Og”, mas pertencia na verdade a um advogado. Outro contato, com o sobrenome “Falcão”, é citado como uma possível referência ao ex-chefe de gabinete do ministro Og, Rodrigo Falcão. Mas o contato também era de um advogado. Procurado, o ministro Og Fernandes não se manifestou.

A investigação apurou se houve vazamento de uma decisão sigilosa do ministro Og Fernandes na Operação Faroeste, compartilhada pelo lobista Andreson. A hipótese inicial da PF era que o responsável pelo vazamento seria o então chefe de gabinete Rodrigo Falcão, porque Andreson dizia nos diálogos que tinha proximidade com um servidor de nome “Rodrigo” no gabinete do ministro.

Mas a PF constatou que o arquivo da decisão compartilhada pelo lobista já estava disponível em um site jornalístico, o que indica que não houve acesso privilegiado dele nesse caso. Por isso, a PF concluiu que não foi possível comprovar a hipótese inicial, de que o vazamento teria ocorrido por meio do chefe de gabinete de Og.

Para a Polícia Federal, o uso de nomes falsos pode ser uma estratégia do lobista para camuflar os atos ilícitos e ainda precisa ser investigada. Por se tratar de um relatório parcial, a PF não realizou indiciamento dos alvos investigados e apresentou linhas para aprofundar a apuração.

“Importa ressaltar, contudo, que a prática de salvar números telefônicos sob nomes de terceiros é expediente recorrente em contextos de ocultação e dissimulação de ilícitos, justamente para despistar eventual vinculação entre o interlocutor real e as comunicações mantidas”, afirmou a PF.

Diante dessas novas informações, a PF pediu ao relator do caso, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Cristiano Zanin, autorização para aprofundar as investigações sobre esses fatos.

“A análise das comunicações revelou o uso sistemático de linguagem cifrada, codinomes, contatos fictícios e documentos mascarados, além da possível utilização de aparelhos e aplicativos voltados à ocultação da origem, identidade dos interlocutores e da natureza ilícita das tratativas”, diz o relatório.