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Boa noite, Quinta Feira 11 de Dezembro de 2025

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Indenização do passado

Sentença de juiz de Sinop contradiz entendimento dos tribunais

Advogados listam 5 decisões no último ano opostas ao entendimento do magistrado

Geral | 11 de Dezembro de 2025 as 16h 10min
Fonte: Jamerson Miléski

Foto: Divulgação

“Uma verdadeira contradição”. Foi esse termo utilizado pelos advogados para descrever a sentença expedida pelo juiz federal da 1ª Vara de Sinop, Murilo Mendes, no processo que trata da indenização a ser paga pela desapropriação de uma área rural realizada pela Sinop Energia – responsável pela implantação da usina hidrelétrica de Sinop. A decisão, proferida no final de novembro, reduziu em quase R$ 35 milhões o valor da indenização. Mendes pegou o valor de mercado apontado pela perícia contratada pela Justiça e dividiu o total por 2,7. Com a decisão, o imóvel avaliado em R$ 57,8 milhões passou a custar R$ 23,2 milhões para a Usina.

A afirmação de que a sentença de Mendes está na contramão do entendimento dos tribunais está nos embargos de declaração apresentados no dia 1 de dezembro pelos advogados que representam o deputado Dilmar Dal’Bosco e sua esposa Elizabete – proprietários da Fazenda Beckhauser. O imóvel rural localizado em Sinop, medindo 1.157 hectares foi comprado pelo casal no ano de 2003. Em dezembro de 2015 a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), declarou como sendo de utilidade pública 43,7 mil hectares, que poderiam ser desapropriados para implantação da usina hidrelétrica de Sinop. Entre as áreas estavam 1.006 hectares da Fazenda Beckhauser, que foi desapropriada pela Usina em fevereiro de 2017, com a finalidade de reassentar as famílias do Assentamento 12 de Outubro, que teriam suas terras alagadas pelo empreendimento. Na época a Sinop Energia avaliou o imóvel em R$ 22 milhões. Desde então o deputado e a esposa contestam o valor. A defesa de Dilmar avaliava a fazenda em R$ 92,6 milhões.

Após 8 anos de disputas judiciais, com a contratação de peritos em avaliação e extensa discussão sobres os valores, a sentença em 1ª instância não conseguiu sanar o conflito. O descontentamento, da parte de quem perdeu a terra, é de que o magistrado não seguiu os valores apontados no laudo de avaliação para determinar a indenização.

Os embargos de declaração são um dispositivo jurídico usado para pedir que um juiz esclareça pontos de uma decisão, em geral apontando erros de método, omissões ou contradições. Na peça apresentada pela defesa de Dilmar, os advogados frisam que a sentença expedida por Mendes ignora o artigo 26 do Decreto Lei 3.365/41 – que a principal lei que trata da intervenção do Estado na propriedade privada. A legislação determina que, em casos de desapropriação de imóveis, o valor da indenização deve ser contemporâneo a avaliação. Ou seja, o valor atual não de quando a área foi “tomada”. “A justa indenização corresponde à compensação que garante ao expropriado a recomposição integral de seu patrimônio, de forma a deixá-lo absolutamente indene, possibilitando-lhe a aquisição de outro bem de plena equivalência”, citam os advogados no embargo.

Pagar o preço de 2017 e não de 2022 (quando a avaliação do perito foi concluída), defendem os advogados, é premiar as manobras protelatórias empregadas para adiar a avaliação – nesse caso, vence quem se esforçou para que a justiça fosse lenta.

Para fundamentar que o “raciocínio da hipervalorização artificial do imóvel” aplicado por Mendes foi um equívoco, os advogados listaram 5 decisões recentes de juízes federais de outros estados e também dos desembargadores do TRF (Tribunal Regional Federal), instância superior onde esse processo deve ser contestado caso não haja uma revisão no acórdão em Sinop. Os embargos citam a decisão da desembargadora de Minas Gerais, Mônica Aragão Martiniano Ferreira e Costa, em 11 de novembro desse ano; a sentença do desembargados de Santa Catarina Jorge Luiz de Borba, em 18 de novembro desse ano; do juiz federal Marllon Sousa em 25 de março de 2025; do desembargador do TRF Cesar Cintra Jatahy Fonseca, em maio de 2025; e do desembargador do TRF Neviton de Oliveira Batista Guedes em agosto de 2024. Todos mantendo o entendimento de que o valor da indenização deve ser o preço atual de mercado. “O entendimento jurisprudencial é uníssono no sentido que o valor da indenização deve ser suficiente para que o expropriado possa adquirir um bem equivalente ao daquele que fora desapossado”, relatam os advogados nos embargos.

 

Alegação virou provação

Outro ponto apontado pela defesa de Dilmar no processo é que uma alegação feita pela usina foi tomada como se fosse uma verdade processual pelo juiz federal Murilo Mendes.

Nas alegações finais, os advogados da Sinop Energia apresentaram um recorte da declaração de Imposto de Renda do deputado, sustentando que no ano de 2017 ele teria comprado uma área de 1.263 hectares por R$ 6 milhões. A informação foi tomada como ponto de partida para o “raciocínio da hipervalorização”, que terminou com o juiz pegando o valor apontado pelo perito e dividindo por 2,7. A premissa era de que Dilmar pegou os R$ 22 milhões depositados pela usina referente a indenização, comprou uma área maior por um valor menor e, portanto, já estaria mais do que “indenizado”. Para a defesa de Dilmar, não passa de uma alegação.

Os embargos afirmam que o juiz tomou um lançamento contábil de pagamento parcial de uma possível compra de uma área que sequer foi periciada como se fosse uma prova incontestável. Os advogados abrem vários questionamentos como o local onde está essa área, quais são as características dela, como a transação foi feita, qual é o preço médio dos imóveis próximos a essa área e de fato quanto custou. As indagações não respondidas no processo deixam claro que o magistrado nada sabe sobre a compra do imóvel que embasou sua decisão.

Com o embargo a defesa do casal Dal’Bosco pede que acórdão seja reformado por Mendes para que os vícios na sentença sejam sanados. Em caso de embargos de declaração, o prazo de oposição é de 5 dias uteis após a sentença, o que ocorreu no dia 1 de dezembro. A Sinop Energia tem 5 dias úteis para apresentar suas contrarrazões, o que ocorreu no dia 4 de dezembro. O juiz tem mais 5 dias a partir disso para julgar o assunto, prazo que encerraria hoje, quinta-feira (11). Até o fechamento dessa reportagem nenhuma decisão de Mendes sobre os embargos havia sido publicada.