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Bom dia, Quinta Feira 08 de Maio de 2025

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Gargalo público

Os problemas da Justiça Federal de Sinop

Subseção tem superlotação de processos, juiz titular em outro Estado, ações repassadas para outras subseções e dependência de mutirão para encolher a fila

Geral | 07 de Maio de 2025 as 17h 28min
Fonte: Jamerson Miléski

Foto: Divulgação

Mais de 20 mil processos em tramitação e cerca de 6 mil novos processos por ano ingressando nessa fila. O mais antigo juiz local já não mora na cidade. Para tentar desafogar o congestionamento de ações na subseção local, o remendo encontrado foi “exportar” os processos para Cuiabá. Para ações da área ambiental, a esperança de uma tramitação mais célere está depositada nos mutirões criados para bater meta até a COP30.

Essa é a situação da Subseção da Justiça Federal de Sinop. A repartição do TRF1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região), criada para atender a 4ª maior cidade de Mato Grosso e outros 23 municípios da região encontra problemas para manter um bom fluxo de processos.

A Corregedoria do TRF1 iniciou nesta segunda-feira (5), um processo de correição-geral na seção judiciária de Mato Grosso. O processo será concluído na sexta-feira (9). A última correição foi realizada em 2023. Na época, o relatório assinado pelo corregedor Néviton Guedes resumia a situação da subseção de Sinop: “A unidade possui muitos processos com conclusões fora do prazo”.

São duas varas da Justiça Federal em Sinop. Na última correição, movimentações simples como arquivamento e recebimento de Mandados de Segurança estavam atrasadas. “Fato que demonstra falta de gerenciamento das tarefas”, relatou o corregedor em maio de 2023.

Na época, somando as duas varas, havia 1.376 processos cuja conclusão estava atrasada em mais de 60 dias. Outros 1.449 estavam com suas conclusões fora do prazo a mais de 180 dias. Pelo menos meio ano.

O atraso fora justificado como um problema na mudança do prédio. A Subseção de Sinop foi para sua sede própria e com isso o trâmite de processos na Secretaria ficou paralisada: 5 meses na 1ª Vara e 9 meses na 2ª Vara.

Mesmo passados 2 anos da última correição, a morosidade no desfecho dos processos continua sendo uma máxima. “É uma questão de gargalo. Falta estrutura para atender a demanda que Sinop e região tem da Justiça Federal. Em geral, os processos tramitam de forma lenta”, declarou o presidente da OAB Sinop (Ordem dos Advogados do Brasil), Reginaldo Monteiro de Oliveira.

A Justiça Federal de Sinop foi criada no ano de 2006 e recebeu de pronto 4,5 mil processos para cuidar. Em 2012, mais de 10 mil processos tramitavam na Vara única. Uma segunda vara foi criada e os 10 mil processos divididos. Hoje cada uma das varas assiste há mais de 10 mil processos.

A maior parte, quase 50%, são referentes a Ações Previdenciárias – gente que precisa das decisões da Justiça Federal para conseguir acessar seus benefícios junto ao INSS. Cerca de 25% são ações civis, com uma boa parcela de ações referentes a Caixa Econômica e ao Programa Minha Casa Minha Vida. Outros 25% são ações referentes a Execuções Fiscais – basicamente, questões tributárias.

Segundo Reginaldo, para tentar desafogar a Subseção de Sinop, no final de 2024 foram transmitidas para uma Vara da Justiça Federal em Cuiabá todas as ações referentes a Execução Fiscal. A medida não ajudou a resolver a celeridade na resolução dos processos. “Apenas transferiu o problema de lugar. Antes estava travando aqui na região. Agora está travado em Cuiabá”, observou o presidente da OAB.

Embora quase todo trabalho da Justiça Federal esteja sendo realizado de forma remota, pela internet, ter o processo em outra cidade acaba dificultando o acompanhamento do advogado, já que a instrução do processo começou em outro lugar. “É sempre diferente acompanhar um processo com o juiz aqui”, afirma Reginaldo.

E esse é o terceiro ponto de fragilidade da Justiça Federal de Sinop: o juiz não está aqui. Murilo Mendes, titular da 1ª Vara local desde 2007, está atualmente em Florianópolis. Há aproximadamente um ano ele faz um tratamento de saúde na capital catarinense e de lá despacha como juiz federal. Sua atuação, por teletrabalho, está amparada pela lei.

Murilo não é o único juiz federal em outro CEP julgando processos que nasceram em Sinop. Em março desse ano o TRF1 lançou o “Tribunal da Sustentabilidade” – basicamente uma campanha para tentar dar celeridade no julgamento de processos de temática socioambiental, tentando “limpar a pauta” até a COP30 (Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas), que será realizada em Belém (PA). Esse mutirão tem feito com que ações ambientais de Sinop e região sejam distribuídas para juízes de outras subseções julgarem. “É mais um caso do processo ser julgado em um lugar diferente de onde foi a instrução”, avalia o presidente da Ordem.

Para o presidente da Ordem, toda a administração pública é uma engrenagem da qual a sociedade depende e o Poder Judiciário também faz parte dela. Um “gargalo” que estrangula a resolução de problemas por parte da Justiça Federal acaba sendo sentido por toda a sociedade, impactando a economia e a vida das pessoas. “Em uma questão de uma área embargada por exemplo. Se o juiz demorar 40 dias para conceder uma liminar, o produtor já perdeu a janela de plantio. Será uma safra que não será colhida. Se olharmos para as demandas referentes ao INSS, estamos falando da porção mais fragilizada da nossa sociedade, que está esperando a posição do judiciário para conseguir acessar aquele benefício, que provavelmente é sua única expectativa de conseguir se manter”, analisou Reginaldo.

 

Uma terceira via

Segundo o presidente da OAB Sinop, há um movimento reunindo esforços para buscar a implantação de uma 3ª vara no município. A estrutura, estabelecida como uma nova unidade jurisdicional, com magistrado titular e uma equipe compatível de servidores, seria a resposta para os problemas da Justiça Federal em Sinop.

Mas essa é uma questão burocrática. O CNJ (Conselho Nacional de Justiça), tem uma fórmula própria para decidir quando abre ou não uma vara. É uma conta genérica, que leva em conta a média de processos em tramitação por vara. Caso a média não esteja “estourada”, o CNJ prefere cambiar os processos para uma vara menos “afogada”. É o que fez os processos de execução fiscal de Sinop viajarem para Cuiabá. “A questão é que o judiciário não é genérico. Cada vara tem sua peculiaridade. Tomando como exemplo o fórum de Sinop. Uma vara da fazenda pública com 5 mil processos não está sobrecarregada. Já uma vara criminal ou da família com 3 mil processos precisa urgentemente ser ampliada. Tem a ver com a natureza do que cada vara trata, da necessidade de fazer júri, de conciliar famílias, enfim. Não se chega a uma resposta com uma fórmula”, apontou.

A matemática também não tem ajudado o CNJ a perceber a especificidade da região Norte de Mato Grosso. Com alto índice de crescimento econômico, Sinop e seu entorno expandem demograficamente e socialmente a cada ano, gerando demandas do poder público de toda natureza – inclusive da Justiça Federal.

Para que uma 3ª Vara da Justiça Federal em Sinop seja criada, o primeiro rito é que o TRF1 apresente a propositura. Depois o Conselho Superior da Justiça Federal precisa dar o aval. Só então a proposta migra para o CNJ, que vai avaliar as questões técnicas e também orçamentárias. Se a resposta for positiva e todos os indicadores forem atendidos, a proposta vira um projeto de lei, que então precisa ser apreciada pela Câmara Federal, pelo Senado e então ser sancionada pelo presidente da República.

Uma vez aprovada a lei, o Judiciário iniciará a implantação da 3ª vara. Para alguns, talvez seja tarde demais.