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Artigo

O preço da insensatez

05 de Maio de 2025 as 19h 43min

É muito difícil encontrar registro na história moderna de um líder nacional que tenha tomado medidas tão prejudiciais à economia do seu próprio país como fez o presidente americano Donald Trump ao aumentar unilateralmente as tarifas comerciais a todos os países que fazem negócios com os EUA. Um verdadeiro espetáculo de autofagia econômica que prejudica a economia global, mas, antes, causa estragos irreparáveis às empresas e aos consumidores americanos.

Simultaneamente ao aumento das tarifas do comércio exterior, a administração federal americana abriu duas outras frentes de batalha. A deportação em massa de imigrantes e ataque ideológico, financeiro e tributário contra as maiores universidades daquele país.

A elevação das tarifas aumenta os preços domésticos ao encarecerem as importações, imprescindíveis ao bom funcionamento da indústria dos EUA. A expulsão sumária e massiva de trabalhadores estrangeiros aumentou o custo da mão de obra na indústria, agropecuária, comércio, construção civil e serviços em geral.

Ao meu entender, a liderança americana não resistirá muito tempo com essa política fratricida de tarifaço tsunâmico. Será forçado a recuar e promover negociações com os países mais afetados, especialmente China, União Europeia, México e Canadá

O ataque às universidades, extraordinários centros de conhecimento, pode custar a perda da liderança da inovação tecnológica que os americanos conquistaram a duras penas e se constitui no principal motor do seu progresso econômico após a segunda guerra mundial.

A conta da insensatez já começa a ser cobrada.

Vejamos o exemplo dos fazendeiros americanos. Já se encontram à beira do pânico. Precisam importar, 70% do potássio que utilizam nos fertilizantes de suas lavouras do Canadá, um dos países mais sobretaxados. Seus caminhões, tratores, colheitadeiras e outros equipamentos agrícolas precisam de peças que são importados do México. Penam com a falta de mão de obra e precisam, desesperadamente, vender sua produção para a China, que suspendeu as compras de commodities agropecuárias americanas e aumentou as encomendas do Brasil, Argentina, Austrália e Uruguai.

Segundo reportagem publicada pelo Financial Times, as maiores empresas do varejo, como Amazon, Coca Cola, McDonald’s, Starbucks, Walmart, Domino’s Pizza, Colgate-Palmolive, Procter & Gamble “...tiveram perdas expressivas em seus negócios” no primeiro trimestre de 2025. Em relatórios enviados aos clientes, grandes bancos constatam que a redução de consumo é maior entre as famílias de menor renda, especialmente das famílias hispanolatinas, que, diante das incertezas, reduziram consumo à espera de alterações mais favoráveis.

As grandes companhias da indústria de tecnologia e automotiva, apresentaram significativas perdas de faturamento e lucros no primeiro trimestre. Empresas como Apple, Oracle, Nvídia, Google, Microsoft, Meta, Tesla, Stellantis, Ford, General Motors, viram suas ações perderem valor no mercado de capitais diante do baixo desempenho no primeiro quarto do ano com a queda de vendas no mercado doméstico e nos mercados internacionais.

No mercado financeiro o cenário de retração se repete. O PIB do primeiro trimestre apresentou queda de 0,3%, o dólar desvalorizou 9% e as bolsas americanas tiveram queda de janeiro a março. Pela primeira vez, depois de longo tempo, aparece no radar dos analistas a possibilidade da economia dos EUA entrar em um ciclo de estagflação, que é a estagnação da atividade econômica com inflação alta. A soma desses fatores já produziu um primeiro resultado: as bolsas de valores europeias estão com desempenho melhor que a bolsa americana.

Umas das poucas concordâncias entre economistas do mundo inteiro é que aumentar tarifas reduz o comércio internacional, aumenta custos e preços, eleva a inflação e diminui o crescimento.

Ao meu entender, a liderança americana não resistirá muito tempo com essa política fratricida de tarifaço tsunâmico. Será forçado a recuar e promover negociações com os países mais afetados, especialmente China, União Europeia, México e Canadá. Os primeiros sinais já foram emitidos na semana passada por iniciativa do governo americano.

No cenário geoeconômico global, a China percebeu uma extraordinária oportunidade para disputar a liderança mundial com a maior economia do planeta e acelerou negociações com países da zona do euro e da américa latina.

É improvável, em médio prazo, que os EUA percam a liderança da economia global. Mas o gigantesco tarifaço levou todos os países, a começar por China e União Europeia, a iniciarem movimentos estratégicos para reduzir a suas dependências do mercado americano. Tal fato, ainda que não produza efeitos imediatos, pode, a longo prazo, reduzir a importância da economia americana no comércio internacional, o dólar perder parte do seu papel de moeda de reserva e de transações internacionais e, por conseguinte, afetar a liderança geopolítica e geoeconômica no cenário mundial.

Vivaldo Lopes

Artigo

*Vivaldo Lopes, economista formado pela UFMT, onde lecionou na Faculdade de Economia.  É pós-graduado em  MBA- Gestão Financeira Empresarial pela FIA/USP . E-mail: vivaldo@uol.com