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MT lidera feminicídios: o papel do SUAS e da Psicologia na proteção das mulheres
01 de Agosto de 2025 as 14h 46min
Em Mato Grosso, a violência de gênero segue como uma das mais graves violações de direitos humanos e um desafio contínuo à segurança e à dignidade das mulheres. Pelo segundo ano consecutivo, o estado lidera o ranking nacional de feminicídios, com 47 mulheres assassinadas em 2024 e outras 28 mortes já registradas apenas no primeiro semestre de 2025.
Dados recentes do Observatório Caliandra, do Ministério Público Estadual, revelam um cenário alarmante: mais de 70% dos feminicídios ocorreram dentro da própria residência das vítimas, sendo 43% cometidos com armas brancas, como facas e facões. A faixa etária mais atingida é a de mulheres jovens, entre 25 e 29 anos, seguida pelas de 40 a 44 e de 50 a 54 anos.
A brutalidade e a recorrência desses crimes escancaram a urgência de políticas públicas efetivas, articuladas e comprometidas com o enfrentamento à violência de gênero. Nesse contexto, o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) configura-se como uma rede fundamental de proteção para mulheres em situação de vulnerabilidade. Através da Proteção Social Especial, o SUAS oferece suporte a famílias e indivíduos em risco pessoal e social, seja por violência doméstica, abuso, abandono, entre outras violações. O principal equipamento da rede para esses atendimentos é o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), que garante acolhimento, escuta qualificada, orientação jurídica, apoio psicológico e articulação com outras políticas públicas.
A Psicologia tem papel central nesse processo. Psicólogas e psicólogos atuam diretamente no acolhimento emocional das vítimas, oferecendo escuta sensível, apoio na elaboração dos traumas e estratégias para o enfrentamento da violência. Esse cuidado psicológico é essencial para o rompimento do ciclo da violência e contribui significativamente para o fortalecimento da autoestima, da autonomia e da saúde mental das mulheres.
O SUAS vai além da resposta imediata à violência. Sua atuação visa também a reconstrução da vida das mulheres: promove o resgate da autoestima, o fortalecimento de vínculos sociais e familiares, e a reinserção no mercado de trabalho. Essa perspectiva integral reconhece que a proteção vai além da segurança física — ela passa também pela autonomia, pertencimento e cidadania.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a violência doméstica é um grave problema de saúde pública, com impactos profundos na integridade física e emocional das vítimas. Muitas vezes, essas mulheres vivem em ciclos contínuos de agressão, passando por diferentes serviços sem obter proteção real. Nesse cenário, o trabalho do CREAS destaca-se não apenas pela oferta de serviços, mas pela atuação qualificada de suas equipes, que enfrentam cotidianamente concepções culturais arraigadas e naturalizadas sobre o papel da mulher na sociedade.
A prevenção e o enfrentamento da violência contra a mulher requerem, portanto, uma ação coordenada entre diversas frentes: saúde, educação, segurança pública, justiça e assistência social. O SUAS cumpre seu papel ao integrar essa rede e garantir o direito à proteção e à reconstrução de vidas. Por isso, fortalecer os equipamentos da assistência social, capacitar as equipes – incluindo assistentes sociais, psicólogas e psicólogos – e ampliar os recursos destinados às políticas públicas é mais do que uma medida administrativa — é um compromisso com a vida e a dignidade das mulheres mato-grossenses.
Junio de Souza Alves
Junio de Souza Alves é psicólogo do SUAS/CREAS e membro do MovimentaPSI