CAR
ONGs apontam que instrumento de regularização está a serviço da grilagem em MT
Relatório mostra relação direta entre cadastros ambientais rurais e uso indevido de mais de um milhão de hectares em territórios indígenas em Mato Grosso por particulares
Geral | 10 de Outubro de 2024 as 18h 23min
Fonte: Isso é Notícia

O relatório técnico elaborado pela Operação Amazônia Nativa (OPAN), em parceria com o Instituto Centro de Vida (ICV), lançado quinta-feira (3), mostrou que mais de 1 milhão de hectares inscritos como propriedades ou posses rurais no Cadastro Ambiental Rural (CAR) incidem em terras indígenas em Mato Grosso.
Lideranças indígenas participaram do lançamento e apontaram a gravidade do problema, que acontece quando a Secretaria de Estado de Meio Ambiente de Mato Grosso (SEMA-MT) permite que particulares registrem essas áreas, que são, conforme a Constituição Federal de 1988, destinadas ao usufruto exclusivo dos povos indígenas. Essa prática irregular gera inúmeros problemas sociais e prejudica a reprodução cultural e física das comunidades.
“É uma tristeza o território estar acabando e não ter respeito. Está tendo desmatamento sem limite. O governo libera para o desmatamento e a grilagem, sabendo que o território tem dono”, afirmou Dineva Maria Kayabi, liderança do povo Kawaiwete, sobre a Terra Indígena (TI) Batelão, que está localizada entre os municípios de Juara, Nova Canaã do Norte e Tabaporã.
O estudo mostrou que essa terra tem 99,87 mil hectares de sobreposição por imóveis rurais. Com uma área total de 117,19 mil hectares, 85% de seu território encontram-se inscritos no CAR.
Mapa: OPAN
Em 2020, o relatório técnico elaborado pela OPAN apontava que haviam 47,38 mil hectares de sobreposição de imóveis rurais à Terra Indígena Batelão. Os números apresentados confirmam o gigantesco aumento da área sobreposta de imóveis rurais sobre a terra indígena, chegando a 110% de aumento num período de três anos, entre 2020 e 2023.
A presidente da Federação dos Povos e Organizações Indígenas de Mato Grosso (Fepoimt), Eliane Xunakalo, também participou do lançamento e afirmou que a instituição vai tomar providências.
“O CAR está sendo usado para grilagem e isso provoca problemas sociais. E isso acontece há muito tempo. A Fepoimt pretende usar esses dados para entrar com medidas judiciais, ou conversar com o próprio estado, SEMA, para que reveja esse procedimento, e reconsidere a forma como está sendo feita, pois é inadequada e está ferindo os nossos direitos”.
TI Apiaká do Pontal e Isolados
Em pesquisa recente, no mês de setembro, a equipe da OPAN identificou a sobreposição de dois imóveis à TI Apiaká do Pontal e Isolados, no município de Apiacás, ambos com status de validado e sem passivo ambiental.
Os imóveis têm o mesmo proprietário. Uma das fazendas foi registrada em 7 de agosto de 2020, enquanto a outra foi registrada em 17 de julho de 2020. Os dois cadastros foram validados em 21 de fevereiro de 2024.
As duas fazendas somam uma área de 2,49 mil hectares e correspondem a 25 módulos fiscais, sendo, portanto, classificadas como grandes propriedades. É importante destacar que, além da sobreposição à terra indígena, as duas propriedades também se sobrepõem ao Parque Nacional do Juruena, uma unidade de conservação de proteção integral.
Sobre o estudo
Para identificar os CARs sobrepostos a terras indígenas em Mato Grosso, foram realizadas análises a partir de dados obtidos junto à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e à SEMA. Utilizando o Sistema de Informação Geográfica foi possível cruzar os polígonos das terras indígenas e dos imóveis rurais cadastrados no Sistema Mato-grossense de Cadastro Ambiental Rural (Simcar). Além disso, foram realizadas análises espaciais que tratam do dimensionamento das áreas sobrepostas às terras indígenas.
“Com os dados levantados, conseguimos mostrar o quanto a SEMA-MT não segue os seus próprios critérios no momento das análises de CAR sobrepostos às terras indígenas em MT”, avalia Ricardo Carvalho, indigenista da OPAN e um dos autores do estudo. “Além disso, também mostramos o quanto o critério que ela diz seguir está errado ao considerar apenas terras indígenas com portaria declaratória no momento de bloquear CAR sobrepostos à terras indígenas”, afirma.
O CAR é um registro público eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais. Ele foi criado com a finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais referentes às Áreas de Preservação Permanente (APPs), de uso restrito, de Reserva Legal, de remanescentes de florestas e demais formas de vegetação nativa e das áreas consolidadas. As informações compõem uma base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento ilegal.
Criado pelo Código Florestal em 2012 como ferramenta de regularização ambiental, o CAR acabou se tornando um instrumento a serviço da grilagem. Ele não tem finalidade fundiária, mas a inscrição irregular em áreas consideradas como não cadastráveis, como as terras indígenas, abre caminho para o desenvolvimento de atividades econômicas por terceiros nesses territórios, violando a Constituição, que garante usufruto exclusivo das terras aos povos indígenas.
Conforme o relatório, nas terras indígenas em estudo e delimitadas, que representam 8% do número total de territórios em Mato Grosso, se concentram 49% da área de imóveis rurais sobrepostos.
Cerca de 82% dos cadastros em terras indígenas de Mato Grosso encontram-se ativos, ou seja, aguardam análise ou estão em alguma fase do processo de validação. Em contrapartida, apenas 13% deles foram cancelados e 5% indeferidos, o que equivale a uma área de pouco mais de 130 mil hectares. Esse cenário contraria a IN 02/2014 do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, que afirma que a situação do CAR deve constar como pendente quando estiver em sobreposição com terras indígenas.
Para a analista socioambiental do Instituto Centro de Vida (ICV), Júlia Mariano, colaboradora do estudo, a sobreposição de cadastros rurais em terras indígenas vai além da violação dos direitos dos povos originários.
“Apesar da legislação determinar que os cadastros ambientais rurais em terras indígenas devem ser indeferidos, nossos resultados mostram que na realidade não é bem assim. Muitos territórios indígenas ainda têm imóveis cadastrados e registros ativos, o que os deixa vulneráveis a atividades ilegais. Essa situação não só desrespeita a lei, mas também ameaça a integridade desses espaços e comunidades”, ressalta Júlia.
Lançamento do documento
O lançamento do relatório foi online, realizado pelo Observatório Socioambiental de Mato Grosso (Observa-MT), com mediação da consultora jurídica, Edilene Fernandes, e teve a participação do indigenista da OPAN, Ricardo Carvalho, da analista socioambiental do ICV, Julia Mariano, do vice-coordenador da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Alcebias Constantino Sapará, da diretora-executiva do ICV, Alice Thuault, representando o Observatório do Código Florestal (OCF) a analista de políticas públicas do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), Patrícia da Silva, da liderança indígena Dineva Kayabi e da presidente da Fepoimt, Eliane Xunakalo.
“Estudos como esse comprovam que a gente precisa estar alerta sobre o que o CAR pode ser e no que pode se transformar. Quando a gente abre uma nova legislação, eu digo que a gente abre uma ‘caixa de pandora’. No final das contas o que nós temos visto, dentro do Observa-MT, é que a gente precisa olhar depois da lei aprovada, como será regulamentada e, mais do que isso, como vai ser validada dentro do Judiciário”, concluiu Edilene Fernandes.
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