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Cannabis medicinal

Nova resolução do CFM pode voltar a restringir o uso de medicamentos à base de cannabis

Geral | 27 de Maio de 2024 as 08h 19min
Fonte: Isto é

Foto: Divulgação

No dia 14 de outubro de 2022, o Conselho Federal de Medicina divulgou uma resolução que restringia os usos da cannabis medicinal, permitindo sua receita apenas para tratamentos de Síndrome de Dravet, Lennox-Gastaut e no Complexo de Esclerose Tuberosa. Devido à grande repercussão contra essa resolução, ela foi suspensa temporariamente no dia 20 de outubro do mesmo ano. 

A partir de então, não houve uma nova resolução, não existindo nenhuma vigente nos últimos dois anos. Contudo, este ano, 2024, há a possibilidade de uma nova resolução, ou retorno da antiga, ser divulgada até o fim do ano, o que preocupa médicos e pacientes que utilizam esses medicamentos à base de cannabis

 

Principais usos e benefícios da cannabis medicinal 

Em entrevista com o doutor Pedro Pulcherio, médico integrativo e pioneiro no tratamento com cannabis medicinal, o especialista explicou os principais usos desses medicamentos.

Dr. Pedro Pulcherio. “A maconha medicinal é utilizada para tratar uma variedade de condições de saúde. As substâncias ativas da maconha, principalmente o CBD (canabidiol) e o THC (Tetrahidrocanabinol), são utilizadas na medicina para o tratamento de situações como esclerose múltipla, epilepsia e dor crônica causada pela artrite ou fibromialgia. Além disso, a maconha medicinal pode ser usada para diminuir a rigidez muscular e a dor neuropática em pessoas com esclerose múltipla, entre outros”.

Quanto aos benefícios desses tratamentos, o médico ressalta.

Dr. Pedro Pulcherio. “Os benefícios terapêuticos são diversos. Pode aliviar dores crônicas, causadas pela artrite, fibromialgia ou enxaqueca; diminuir a inflamação em doenças como síndrome do intestino irritável, psoríase, doença de Crohn e artrite reumatoide; aliviar náuseas e vômitos causados por quimioterapia, e estimular o apetite em pacientes com AIDS ou câncer. Além disso, a maconha medicinal tem mostrado resultados significativos no tratamento de diversas doenças, como epilepsia e esclerose múltipla”.

 

Consequências de uma nova resolução e da restrição dos usos da cannabis medicinal 

Quanto à possibilidade de retorno à resolução antiga ou da divulgação de uma nova com as mesmas restrições, o doutor revela algumas das consequências possíveis.

Dr. Pedro Pulcherio. A restrição do uso medicinal da maconha poderia potencialmente limitar o acesso dos pacientes a um tratamento que tem se mostrado eficaz para uma variedade de condições de saúde. Além disso, a restrição poderia desacelerar ou barrar pesquisas científicas sobre a maconha medicinal.

Segundo ele, a Associação Médica Brasileira de Endocanabinologia e a Associação Pan-Americana de Medicina Canabinoide estão trabalhando para garantir o direito dos médicos de prescrever canabinoides para seus pacientes. Além disso, promovem a divulgação de informações de qualidade relacionadas à medicina canabinoide tanto à população quanto à classe médica.

 

Diferenças entre o THC e o CBD

Para aprofundarmos o assunto quanto aos medicamentos à base de cannabis medicinal, o colunista, Dr. Pedro Rosa, explica as principais diferenças entre os dois mais usados canabinoides, tanto em relação à eficácia quanto aos riscos de uso.

Dr. Pedro Rosa. “A cannabis medicinal é composta por diversos canabinoides, entre os quais destacam-se o THC (tetra-hidrocanabinol) e o CBD (canabidiol). Estes dois compostos, embora originados da mesma planta, possuem propriedades farmacológicas extremamente distintas”.

“O THC é o principal componente psicoativo da cannabis. É conhecido por seus efeitos euforizantes, associados ao uso recreativo da maconha. Esse composto age principalmente sobre os receptores CB1 no cérebro, alterando a percepção, humor, e comportamento do usuário. Ainda, o THC é também um agente controverso no campo da medicina. Embora existam algumas evidências de que pode ser útil no tratamento de náuseas e vômitos, induzidos por quimioterapia, bem como em certos casos de dor crônica, ele é frequentemente associado a efeitos adversos significativos. O THC tem potencial muito relevante para causar dependência, e seu uso contínuo pode levar a problemas cognitivos e uma maior incidência de transtornos mentais, inclusive transtornos do humor e psicóticos”.

“Em contraste, o CBD é não-psicoativo e não causa dependência. Ele tem ganhado reconhecimento por seu perfil de segurança e por algumas propriedades terapêuticas. O CBD age de maneira diferente no organismo, interagindo com uma variedade de receptores que modulam a inflamação, a dor e outros processos fisiológicos. Em termos de segurança, o canabidiol tem se mostrado bastante promissor, com uma baixa incidência de efeitos colaterais, a maioria dos quais são leves e temporários, e sem relação com o surgimento de dependência ou de transtornos mentais”. 

Ainda sobre as diferenças entre esses dois canabinoides, o psiquiatra ressalta que há uma investigação ampla quanto a eficácia do CBD, especialmente no tratamento de epilepsia e dor crônica. 

Dr. Pedro Rosa. “Em relação à epilepsia, estudos robustos e ensaios clínicos randomizados demonstraram que o CBD pode reduzir significativamente a frequência de crises convulsivas em pacientes com epilepsia refratária. No campo da dor crônica, o CBD também tem mostrado potencial clinicamente relevante. Pacientes com dores neuropáticas, artrite e outras condições dolorosas crônicas relataram alívio significativo após o uso de CBD. No entanto, é importante notar que, enquanto a eficácia do CBD para estas condições é bem suportada por evidências, o mesmo não pode ser dito para o THC, cuja eficácia e segurança são menos estabelecidas”.

Em relação à segurança do uso, o CBD tem isso como um de seus pontos mais fortes. Estudos indicaram que esse canabinoide é bem tolerado, ainda que em doses elevadas. 

Dr. Pedro Rosa. “O CBD, com seu perfil de segurança comprovado e eficácia terapêutica para graves problemas de saúde, pode ser liberado para produção e prescrição de forma independente da maconha recreativa. Tal medida permitiria que pacientes que necessitam desse composto tenham acesso seguro e regulamentado ao tratamento, sem incentivar o uso recreativo da maconha”.

 

Educação de uso do cannabis medicinal contra a restrição

Ambos os profissionais revelaram benefícios do uso desses medicamentos à base de cannabis medicinal, explicando suas formas de tratamento para as mais diversas doenças, muitas delas ainda sem outras formas de tratamento com os mesmos resultados positivos. O doutor Pedro Rosa, ainda enfatizou a diferença entre os dois principais canabinoides, explicando os benefícios do CBD e da segurança de seu uso, em contraste com o THC, que pode levar a reações negativas. 

O psiquiatra termina ressaltando a importância da educação médica e da população geral quanto aos pontos positivos desses medicamentos canabinoides, diferentemente dos negativos do uso da maconha recreativa. 

Dr. Pedro Rosa. “É vital que médicos e profissionais de saúde sejam devidamente educados sobre suas indicações e limites. A educação contínua pode garantir que o CBD seja prescrito de maneira responsável e eficaz, maximizando os benefícios para os pacientes e minimizando os riscos. É interessante notar que, embora a prescrição excessiva de medicamentos como benzodiazepínicos e drogas Z seja um problema reconhecido, nunca resultou na proibição dessas substâncias. Medidas de controle de seu uso são fundamentais”.