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Pesquisa

Infravermelho é usado para medir o amido na mandioca

Técnica pode permitir produtor ganhar mais pelas raízes que dão mais farinha

Geral | 29 de Julho de 2020 as 10h 03min
Fonte: Redação com Embrapa

Foto: Assessoria

Uma pesquisa desenvolvida em Mato Grosso comprovou a eficiência do uso de análises de infravermelho médio na identificação de diferentes tipos de amido em etnovariedades de mandioca. A descoberta abre possibilidade para o desenvolvimento de técnicas que permitam saber as características do amido de cada material, possibilitando um diferencial de pagamento para produtos com propriedades de maior interesse para a indústria.

O trabalho foi conduzido por pesquisadores da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” (Unesp Botucatu), Embrapa Agrossilvipastoril (MT) e Universidade de Saskatchewan (Usask), no Canadá, e avaliou 132 variedades de mandioca em áreas dos biomas Cerrado, Pantanal e Amazônia.

Mato Grosso é um dos centros de origem da mandioca no mundo e possui uma grande variabilidade genética. Na região, as plantas florescem e formam sementes, o que gera o cruzamento genético. Além disso, há a presença de parentes silvestres e o trabalho de preservação feito por agricultores e comunidades tradicionais.

Toda essa variabilidade genética tem um grande potencial de apresentar amidos com diferentes características que possam ser de maior interesse para a indústria. O método convencional de levantamento sobre essa variabilidade envolvia a coleta da mandioca no campo e análise total em laboratório. Como trata-se de um produto perecível, o processo era lento, inviabilizando a avaliação de muitas amostras. Outra possibilidade era a coleta de ramas, plantio em áreas experimentais e posterior análise. Isso demandava, além de tempo, espaço para a lavoura e custos elevados para condução. 

Para solucionar esse problema, os pesquisadores testaram um novo método. Um pequeno pedaço da raiz é coletado no campo, ralado e seco no local. Essas amostras menores e com maior durabilidade foram encaminhadas para laboratório, onde foram analisadas com uso de infravermelho próximo e médio. O método com infravermelho médio se mostrou eficaz nos testes. “Essa técnica cruzou duas informações. Ela comprovou que as etnovariedades podem dar amidos diferentes e que o uso do infravermelho médio pode detectar amidos diferentes”, conta a pesquisadora da Embrapa Eulália Hoogerheide.

O resultado permitirá a realização de análises em quantidade maior de amostras, ampliando o potencial de prospecção das etnovariedades, sobretudo na região de Alta Floresta, na borda sul da Amazônia, onde foi encontrada maior diversidade nos tipos de amido. Nas regiões de Acorizal (Cerrado), Sinop (transição Cerrado/Amazônia) e Cáceres (Pantanal) o resultado mostrou maior similaridade tanto com os amidos comerciais brasileiros, quanto com as amostras da Tailândia, usadas na comparação.

Até o momento, a técnica validada aponta apenas a existência de diversidade nos tipos de amido. O objetivo dos pesquisadores, na sequência do trabalho, é ver se a análise de infravermelho também possibilita identificar as características de cada amido. Com isso, será possível saber de antemão o tipo de amido produzido pelas variedades e recompensar o produtor pela qualidade do produto. “Essa é uma opção adicional para identificar variedades importantes e valorizar o desenvolvimento dos esforços realizados por pequenos produtores, cujas áreas abrigam etnovariedades com propriedades especiais e economicamente importantes”, explica Hoogerheide.

 

Amido de mandioca

Os amidos estão presentes em diversas plantas e as fontes mais utilizadas no mundo são milho, mandioca, trigo, batata e, em menor quantidade, arroz. Eles são amplamente utilizados na indústria alimentícia, além de outras indústrias, como de papel e papelão, por exemplo.

Na indústria alimentícia são usados em uma gama enorme de produtos, com objetivo de obter determinada textura, enriquecimento, entre outros. Porém, para ser usado, o produto tem de resistir ao calor, congelamento, descongelamento e refrigeração. Para que o amido comercial atenda a esses requisitos, são usados aditivos químicos.

De acordo com a pesquisadora da Unesp Marney Cereda, com o aumento da demanda dos consumidores por alimentos naturais, sem aditivos químicos, a identificação de amidos que naturalmente apresentem as características necessárias para a indústria passou a ser de maior interesse.

Ela explica que ao longo do tempo, a seleção genética de mandioca foi feita visando obter materiais resistentes a pragas, doenças, com boa produtividade e alto teor de amido. Dessa forma, os bancos de germoplasma passaram a ter materiais semelhantes, sem diversidade na qualidade do amido que possibilite atender à nova demanda do mercado.

Situação semelhante ocorreu com milho, trigo, batata e arroz. Porém, nesses casos, o longo processo de seleção limitou a diversidade genética e é pouco provável que se encontre amidos diferentes, com características naturais de interesse da indústria.

Com a mandioca, entretanto, ainda há uma grande variabilidade genética nos materiais cultivados por comunidades tradicionais e indígenas na Amazônia que não foi explorada pelos programas comerciais de melhoramento genético. Isso leva ao interesse dos pesquisadores pela identificação da variedade nos amidos provenientes de etnovariedades mato-grosssenses.

“Já sabemos que na região Amazônica há amidos diferentes. Agora precisamos retornar lá, coletar uma amostra maior, e analisar para conhecer as características desse amido. Mas já podemos dizer ao produtor que ele tem ali um produto diferenciado”, frisa Cereda.

A análise das características será importante para identificar quais dessas diferenças atendem ao interesse da indústria. Assim, poderá haver um pagamento diferenciado por esse produto.

“O Brasil ficou para trás no mercado da commoditie amido de mandioca. Hoje a Ásia produz em quantidade muito maior. Se o País quiser retomar espaço, não será pela quantidade e sim pela qualidade do amido produzido”, analisa o pesquisador da UFMS Olivier Vilpoux.

De acordo com o cientista, caso se confirme que determinadas etnovariedades geram amido de melhor qualidade e de interesse da indústria, as comunidades ou produtores que cultivaram e preservaram esses materiais poderão comercializá-los e receber royalties pelo produto. A produção em grande escala, entretanto, deve ocorrer em locais próximos às indústrias de amido já instaladas no País, em regiões onde o cultivo da mandioca ocorre em maior área, como Paraná, São Paulo e Mato Grosso do Sul, por exemplo.

 

Etnovariedade x cultivar

Ao longo dos anos, o homem faz seleção genética de plantas conforme seu interesse. Comunidades tradicionais na baixada cuiabana, em Mato Grosso, por exemplo, selecionam variedades de mandioca para produção de farinha. Já comunidades indígenas no Xingu selecionam pensando na produção do beiju. Outros grupos indígenas da Amazônia preferem a mandioca-brava.

Todo esse processo de escolha e replantio de materiais que atendem melhor aos objetivos locais resulta na seleção das chamadas etnovariedades. Elas são conservadas pelos próprios produtores por meio do plantio contínuo. É a chamada preservação on farm e, no caso da mandioca que é nativa de Mato Grosso, é também considerada in situ.

Já a seleção comercial, feita por meio de programas de melhoramento genético de instituições de pesquisa e empresas, resulta na obtenção de cultivares, que são variedades registradas no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). A comercialização dessas cultivares gera royalties para a instituição responsável pelo seu desenvolvimento.