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Luãn Chagas

Professor da UFMT lança livro sobre a escolha das fontes no rádio expandido

Lançamento da obra ocorre nesta sexta-feira (07), durante o IV Simpósio Nacional do Rádio

Educação | 07 de Maio de 2021 as 13h 39min
Fonte: PNB Online

O professor Luãn Chagas, do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Poder (PPGCOM-UFMT), lança o livro “A seleção das fontes no rádio expandido”, nesta sexta-feira (07), às 18h. O evento será durante o IV Simpósio Nacional de Rádio pelo YouTube. 

Fruto da tese de doutorado do autor, a obra, que já está disponível para a venda neste link, lança luz sobre como funciona o processo de escolha das vozes no radiojornalismo de emissoras All News (com noticiário 24h), como a CBN, BandNews do Rio de Janeiro e a afiliada da CBN em Ponta Grossa, interior do Paraná. 

“Alguns livros já nascem clássicos”, afirma o pesquisador de referência em radiojornalismo e professor Marcelo Kischinhevsky, que escreveu o prefácio da obra e orientou a tese de doutorado de Luãn na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). “A leitura do livro traz a certeza de que muitos outros trabalhos de fôlego virão e que Luãn Chagas já desponta como um dos grandes pesquisadores de rádio e jornalismo de sua geração”.

Articulando ideias e revisões bibliográficas de vários autores, Luãn explora a discussão em torno de quem são as pessoas que falam no rádio e no jornalismo, como funciona esse processo de escolha das fontes, que influências são geradas, como é percebido e o que pode ser feito para ampliar a diversidade e a pluralidade de vozes neste espaço da imprensa. Para ele, este ambiente vive uma disputa desigual, uma vez que as assessorias se profissionalizaram ao passo que as redações se apequenaram.

Confira a entrevista completa com o professor Luãn Chagas sobre seu novo livro.

Seu livro é uma adaptação da sua tese de doutorado. Voltando no tempo, como surgiu sua inspiração em investigar quem fala no jornalismo? 

Luãn Chagas: Eu tinha terminado o mestrado fazendo uma pesquisa sobre a cobertura eleitoral em emissoras que eram administradas por políticos no interior do Paraná. Uma das coisas que ficou para aprofundar e legal de pensar era sobre as fontes. No caso do rádio havia uma questão complicada, porque, em uma cobertura eleitoral, muitas vezes a fonte potencial – que é o candidato direto no processo -, é o patrão da emissora. No doutorado, em conversas com meu orientador, a gente ampliou esse leque a partir do momento em que vivemos, em que as emissoras passam por um processo de diminuição do número de profissionais, aumento das tarefas e sofisticação das assessorias de imprensa. Então, quem fala no jornalismo no momento em que as fontes estão cada vez mais profissionalizadas?

De que maneira a seleção de visões sobre os fatos pode impactar na democracia?

Luãn Chagas: Pode impactar diretamente na democracia porque a gente tem uma multiplicidade de pontos de vista que precisam ser considerados no âmbito democrático e precisam estar no jogo do dia a dia. Por exemplo, na discussão que trago no livro, eu tento aprofundar um pouco essa lógica, principalmente no período em que discutimos se é golpe ou impeachment, se é uma reforma administrativa ou retirada de direitos, se é reforma modernizadora da previdência ou atraso, se reforma trabalhista é sofisticação ou amplia desigualdades. Essa luta discursiva de vozes é recorrente no jornalismo. Essa disputa precisa ser, no mínimo, igualitária. Quando não é igualitária, não é uma disputa. Não tem jogo onde os dois, ou vários e múltiplos pontos de vista podem colocar suas questões. A gente tem uma organização, uma estrutura muitas vezes sofisticada, por grandes órgãos, grandes instituições e por jogos políticos que envolvem relações com a imprensa por meio de departamentos de marketing e assessorias, que fazem valer suas opiniões. Percebemos isso quando há mais visões dos patrões e dos empresários no jornalismo do que dos trabalhadores e pessoas que também tem interesses diretos nestes assuntos. É preciso considerar o jornalismo como espaço de disputa ou de hegemonização de determinados discursos? A democracia passa por aí. Muitas vezes ela é atacada, quando, na verdade, há um agendamento e a visão de poucas pessoas da sociedade é passada a partir do momento em que nós, profissionais da imprensa, selecionamos essas vozes para falar sobre determinadas questões.

Como a restrição de vozes afeta a apuração noticiosa?

Luãn Chagas: Alguns jornalistas entrevistados no livro pensam nessa ideia de que se uma notícia que chega a eles por meio das redes sociais só vai ter importância se tiver um subsídio de informações e aí que irão apurar. Apuração depende de jogar essa informação num conjunto de vozes que estão dentro do teu processo de seleção. Se você seleciona exclusivamente uma fala de determinadas fontes proeminentes, não apura, não a contradiz, não busca outras vozes que possam acrescentar – aqui cito desde fontes pessoais até documentos oficiais ou não – , essa apuração pode ser prejudicada. Porque vai deixar passar um determinado dado ou questão que pode ser equivocada, mentirosa e desinformada, que vai passar por esse filtro e levada às pessoas. Muitas vezes se prestam apenas a mobilizar grupos de interesse. Quando a gente mobiliza esses grupos, que vão invadir o Capitólio [nos EUA], o Congresso Nacional [no Brasil] e causar algum tipo de terrorismo na sociedade. Isso é um problema, porque vai estar na capa do jornal, vai passar por um jornalista, que está dentro de uma comunidade interpretativa,  que se formou em uma universidade e faz parte de uma sociologia de uma profissão. Então, é preciso discutir como essa voz está sendo inserida e como ela, muitas vezes, restringe o aspecto da apuração.

Em que medida a utilização de softwares e aplicativos de mensagens ajudam a ampliar a diversidade de vozes? E, por outro lado, até que ponto eles atrapalham?

Luãn Chagas: Você tem uma entrada dessas pessoas no espaço noticioso que é muito importante. Então, há a possibilidade de ampliar essa lógica. Não só eu como outros pesquisadores percebem que isso não necessariamente vai ampliar a diversidade nas temáticas. Por outro lado, essas vozes vão ser selecionadas para falar sobre determinados temas. Então, no meio de uma série de reformas políticas, as pessoas continuam entrando no noticiário para falar de trânsito e segurança, e não são ouvidas para falar de políticas públicas. Claro que há uma preferência pela interação, não uma interatividade ou participação – porque não faz parte do processo de decisão – , pois fica apenas enviando mensagens e deixando sugestão de pauta. Quando essa pauta é encaminhada, ainda é da própria seleção do jornalista que vai recorrer a confirmar isso com as fontes oficiais, vai desconfiar muito. Então, é um processo de desconfiança dessas vozes, o que afeta no processo de diversidade e na construção de outros olhares. É preciso manter o processo de seleção dos jornalistas, mas, por outro lado, garantir com que essas vozes carreguem a potencialidade necessária para pautar a agenda jornalística a partir dos seus lugares de fala, de suas regiões e daquilo em que estão envolvidas no dia a dia.

De que forma o jornalismo pode equilibrar a diversidade? Com a pluralidade daquilo que Milton Santos disse sobre homens lentos e rápidos, citado no livro. Como equilibrar esses diferentes perfis?

Luãn Chagas: A noção de homens lentos e rápidos do Milton Santos na geografia, que vai pensar essas pessoas que estão no cotidiano, de trabalho, que estão dentro de seus carros e não olham a cidade. E esses homens lentos que conhecem a cidade, os caminhos e tem outros olhares. É algo interessante para a gente pensar, porque no caso do jornalismo, temos um espaço de disputa e de muitas vozes. A discussão que fica é: como que a gente seleciona, enquanto jornalista, e como o jornalismo promove esse equilíbrio? Claro que não tem uma receita. Mas a gente consegue demonstrar, através da pesquisa, que é necessário posicionar essas fontes. Na estrutura do texto radiojornalístico você consegue achar essas fontes em zonas altas e baixas. Muitas vezes o texto insere essas fontes primárias nas zonas altas, como sendo o poder público, fontes oficiais, empresários e instituições. Na zona baixa tem as pessoas comuns, até os especialistas são colocados em segundo plano. Percebo que depois da pesquisa e do livro, durante a pandemia de Covid-19, mesmo as vozes que estudam sobre o assunto, são deixadas em segundo plano para priorizar as fontes oficiais e suas declarações negacionistas continuam sendo selecionadas. Até que ponto essa declaração deve ser selecionada? Quando ela propõe algo que gera problemas à sociedade. Esse equilíbrio e cuidado no jornalismo deve ser feito com racionalidade descolonizadora.

Para finalizar, professor, como você articularia a discussão proposta no livro com a interface Comunicação e Poder, tão importante para o PPGCOM-UFMT?

Luãn Chagas: A gente percebe essa interface da comunicação e poder quando discutimos quem fala no jornalismo, quem tem o poder de falar, quem tem acesso a construir esses conhecimentos, quem não fala sobre determinados assuntos e precisa falar e ser ouvido. Quando discutimos o conceito de poder por meio da cidadania, de múltiplas vozes e dos discursos. Precisamos discutir tudo isso e pensar quem são as pessoas por trás desses discursos. Quem é ouvido, quem não é ouvido. Quando a gente pensa, agora no projeto de pesquisa, as racionalidades por trás do processo de seleção das fontes, essa questão mais epistemológica e filosófica, acaba encontrando uma série de caminhos, como uma tradição ou uma questão de racionalidade enquanto países que foram colonizados ou que atravessaram processos políticos conturbados. A gente percebe a ausência dessas vozes. Onde estão as vozes pretas? Negras? Das mulheres? Latino-americanas? Onde estão as vozes que podem exercer sua potencialidade e sua cidadania na hora de opinar? Ainda, infelizmente, a gente tem uma lógica em que o capitalismo, o patriarcado e a colonização acabam envolvendo essas raízes na hora de pensar o processo de seleção e de escolha.