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Negócios

Usina de Sorriso vai produzir etanol de batata-doce

Alternativa ecologicamente correta tem o propósito social de beneficiar a agricultura familiar

Economia | 14 de Julho de 2016 as 09h 53min
Fonte: Jamerson Miléski

O Brasil é o segundo maior produtor de etanol do mundo (atrás apenas dos Estados Unidos), e o maior exportador. Aproximadamente 25% de todo o álcool combustível produzido no mundo sai das usinas brasileiras. O país é considerado o mais eficiente na produção de combustíveis renováveis, graças ao potencial do etanol obtido através da cana-de-açúcar. O método BR é duas vezes mais efetivo, em volume de produção por hectare, que o do líder mundial na produção do combustível. As usinas de etanol de milho, dos Estados Unidos, geram entre 3 a 4 mil litros de álcool por hectare plantado. As do Brasil entre 7 e 8 mil litros por hectare de cana.

Some a viabilidade técnica do método brasileiro à legislação que obriga o aditivo de até 25% de álcool na gasolina e ao sucesso da indústria automobilística nacional com os carros flex. Tudo isso faz do etanol uma potência do agronegócio brasileiro, com amplo mercado e boa rentabilidade. Mas não é para todos.

O principal estado agrícola do país está legalmente impedido de produzir etanol de cana. Pelo menos na maior parte do seu território. Apenas em uma pequena faixa territorial do Mato Grosso o cultivo de cana-de-açúcar é permitido. A limitação foi imposta pelo ZAECANA (Zoneamento Agroecológico da Cana-de-Açúcar), que vetou a cultura nas áreas pertencentes a Bacia do Alto Paraguai e aos biomas Amazônico e Pantanal. Tirando as reservas indígenas e áreas de conservação, restam menos de 10% do território mato-grossense onde o plantio de cana é permitido. Por acaso, a maioria são áreas não aráveis, de relevo acidentado, utilizadas para pecuária. Ou seja, o case mais bem sucedido do mundo para a produção de biocombustível não pode ser desenvolvido no maior estado produtor do Brasil. O contrassenso fechou uma porta, mas abriu outra.

Foi justamente a aparente inviabilidade de produzir álcool combustível em Mato Grosso que levou o empresário Aldo Silva a instalar uma usina na cidade de Sorriso. Veterano da Marinha, Aldo pesquisa há 13 anos o mercado de biocombustíveis com o objetivo de entrar nesse ramo. Sua primeira usina foi instalada no Norte de Mato Grosso, local considerado pelo investidor o mais viável. “A principal razão de escolher pela cidade de Sorriso foi a logística. Aqui o etanol é caro e o milho barato”, ressalta Aldo.

A planta industrial está localizada na região conhecida como Barreiro, às margens da BR-163. São 2 mil metros de área construída. A usina é do tipo “flex”, podendo ser ajustada para produzir biodiesel ou álcool. A capacidade nominal é para 100 mil litros de biodiesel ou 50 mil litros de etanol hidratado por dia.

A planta iniciou a operação em caráter experimental no mês de maio, com uma capacidade para 8 mil litros de etanol de por dia. O começo das operações foi com o milho, cereal abundante no município. Mas o objetivo de Aldo é fazer a usina rodar com batata-doce, o que torna o projeto ainda mais interessante.

Conforme o empresário, operando com milho, a usina produzir 400 litros de etanol por tonelada do grão. Em termos de conversão, o cereal é bem mais rentável que batata-doce, que gera 160 litros de álcool por tonelada. A vantagem está no custo da produção.

Operando com milho, o custo do litro de etanol produzido é de R$ 1,25, considerando o preço médio do grão a R$ 20,00 a saca. O problema é que o preço do milho já não é esse na região. Com a saca cotada a R$ 35,00, o custo do litro produzido é de R$ 1,75.

O valor de venda de etanol, da usina para distribuidora, em janeiro de 2016, era de R$ 2,20. Embora na conta o milho ainda seja opção uma rentável, o negócio se torna melhor com a batata-doce.

Rodando com milho, o principal custo da usina é justamente a matéria prima, e o segundo o vapor (cavaco), que corresponde a 15% do que é gasto com o grão. Com batata-doce, o custo de produção sobe, devido aos produtos químicos e enzimas que farão a quebra do amido. Mas a despesa com matéria prima cai em 60%.

Um litro de etanol obtido através da batata-doce custa para a usina R$ 1,07, ou seja, 39% a menos que o mesmo produto extraído do milho. Outra vantagem para Aldo é que na atual configuração sua usina consegue produzir 12 mil litros de álcool por dia utilizando batata-doce. No milho essa quantidade cai para 8 mil litros dia.

Em uma conta simples, operando ao longo de 20 dias, a usina de etanol do empresário gera um lucro de R$ 72 mil utilizando o milho como matéria prima. Se a produção for com batata-doce, o lucro salta para R$ 270 mil – quase 4 vezes mais.

Para conseguir manter a usina apenas com batata-doce é preciso primeiro desenvolver essa cadeia produtiva. Embora pareça, em uma primeira análise, que isso é interessante apenas para o dono da indústria, motivar essa nova cultura pode ser uma grande oportunidade para a agricultura familiar, que na região é economicamente achatada com a concorrência das commodities. Segundo Aldo, plantar batata-doce não é bom apenas para a indústria.

A raiz utilizada para a produção de álcool é chamada de BDI (Batata-Doce Industrial). Diferente da variedade que ocupa as gôndolas de supermercado, a BDI é rústica, disforme e com um tamanho desproporcional – a maioria não caberia em uma panela. A batata-doce Industrial não aparência, mas tem conteúdo. Conforme Aldo, a variedade tem alto teor de amido, o que é fundamental para a extração de álcool, além de ser bem mais produtiva que a convencional.

Em campos experimentais implantados em Mato Grosso, simulando as condições da agricultura familiar, a BDI teve uma produtividade média de 60 toneladas por hectare. Ela possui um ciclo de produção que oscila entre 4 e 5 meses, o que permitiria duas safras no ano. Além disso, é possível adiar a colheita em até um ano, sendo que após colhida a raiz agüenta até 2 meses. No modelo de produção da agricultura familiar ainda é possível utilizar as ramas para alimentação do gado leiteiro.

As BDI’s foram desenvolvidas pela Embrapa e pela Universidade Federal de Tocantins. Já existem várias cultivares no Estado e a própria usina de Aldo implantou um campo para a multiplicação, afim de fornecer ramas para quem quiser ingressar na atividade. O custo médio para o plantio da BDI é de R$ 1.650 por hectare. Existem implementos para mecanizar todo o processo, do plantio à colheita.

Aldo fez uma simulação da atividade na agricultura familiar, tomando como base um módulo de 300 hectares, espaço de terra de alguns assentamentos da reforma agrária. Na conta do empresário ele elevou o custo por hectare para R$ 2.950,00, incluindo o custo do arrendamento da terra, e considerou a produtividade média em 65 toneladas por hectare. O preço de venda da produção, nessa simulação, foi de R$ 80,00 a tonelada na lavoura, mas é possível chegar até R$ 104,00 a tonelada. Nessa conta, o lucro da safra foi de R$ 675 mil – uma média de R$ 2,2 mil por hectare.    

Aldo considera a batata-doce uma grande oportunidade para o desenvolvimento da agricultura familiar do Estado, algo que para acontecer depende da existência de usinas nesse perfil para absorver a produção. Seu empreendimento está instalado muito próximo a um projeto de assentamento da reforma agrária. Desenvolver a cadeia da batata-doce nessa área significaria viabilizar tanto a indústria como o assentamento. “As usinas que produzem álcool a partir da batata-doce levam o selo de ‘Etanol social’, justamente por absorverem a produção da agricultura familiar e fomentar a atividade rural das pequenas propriedades”, ressalta.

Mato Grosso possui 764 assentamentos da reforma agrária. A maioria está longe de atingir o seu propósito final, que é gerar qualidade de vida e viabilidade econômica ao pequeno produtor, fixando o homem no campo e abastecendo a cidade.

 

Etanol doce

Esse tipo de usina de etanol implantada por Aldo, seja operando com milho ou batata-doce, não gera resíduos nocivos ao meio ambiente. As usinas convencionais de etanol (cana-de-açúcar), geram como sobra da produção o “vinhoto”, e por isso são proibidas na Amazônia pelo ZAECANA.

O que sobra do processo de extração do álcool nesse tipo de planta industrial é um subproduto, rico em proteína, ideal para alimentação animal (suinocultura, bovinocultura, avicultura e até piscicultura). Conforme Aldo, cada tonelada de batata-doce gera 160 litros de etanol e 150kg de massa protéica, basicamente ração animal, com uma concentração de 28,5% de proteína. Caso a matéria prima seja o milho, a sobra é de 480 km de massa protéica por tonelada, sendo com uma concentração menor, de 12%. Ou seja, a batata-doce produz menos em volume, mas o subproduto no fim é mais vantajoso que o milho devido ao preço.

Agregando os ganhos com a venda do etanol e da massa protéica, Aldo estima que uma usina que produza 10 mil litros por dia, tenha um lucro médio de R$ 393 mil por mês operando com batata-doce. Processando o mesmo volume, 10 mil litros, com milho, o lucro médio cai para R$ 171 mil por mês – considerando o milho a R$ 35,00 a saca.

E quanto custa uma usina dessas? Segundo Aldo, os preços das usinas de etanol são como um Fiat Uno e uma Mercedes. “Os dois te levam ao mesmo lugar. Um custa R$ 30 mil outro custa R$ 300 mil. O valor de uma usina depende muito do padrão que o investidor quer, mas existem empresas sérias e com preços dentro da realidade. Eu não vendo usina, mas conheço das melhores às piores”, brinca Aldo.

Conforme o empresário, para implantar uma usina com capacidade de 10 mil litros de etanol dia, similar a sua, o investimento varia de R$ 3 milhões a R$ 10 milhões. Considerando o “meio da tabela”, R$ 6,5 milhões, com o lucro da produção simulado acima, o investimento se pagaria em um intervalo de 17 meses operando com batata-doce e em 38 meses com milho – tomando como base os valores do álcool no mercado, da matéria-prima e do custo de produção listados na reportagem.

Na conta e na ideia a Usina de Etanol Social é um negócio sedutor. Aldo já está rodando a sua.