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Artigo

Bancada evangélica em Sinop

10 de Março de 2021 as 17h 05min

Nos poderes legislativos, é comum que os plurais membros formem bancadas para aumentar a sua representatividade e “poder” de decisão das pautas que passam pelas casas de leis. O mais comum sempre foram as alianças partidárias, com vereadores ou deputados de uma mesma sigla votando em bloco. Também é corriqueira a aproximação de partidos “nanicos”, que dessa forma engrossam seu peso político.

Um fenômeno crescente é a identificação de bancadas por interesse. O Congresso Nacional sempre teve bancadas com interesses setoriais. Mas elas nunca foram tão públicas como agora. Tem a bancada ruralista, a bancada da bala e a bancada da Bíblia.

A agremiação política por afinidade religiosa chegou a Câmara de Sinop. Na sessão desta segunda-feira (8), o vereador Moises do Jardim do Ouro acabou explicitando que existe um agrupamento por credo na jovem legislatura municipal. Ele chegou a usar o termo “bancada evangélica”, desnudando o santo.

Acidental ou proposital, a fala do vereador ocorreu durante a discussão do projeto de lei que tratava da abertura e funcionamento de tempos religiosos mesmo durante a pandemia. Esse projeto foi apresentado por Moisés e outros dois vereadores evangélicos: Hedvaldo Costa e Toninho Bernardes. Se o Moisés bíblico abriu o mar vermelho, o homônimo do Jardim do Ouro abriu o jogo: vereadores da bancada evangélica atuam para templos evangélicos.

Na verdade ninguém se esforçou para esconder a afronta à laicidade da Casa de Leis. Quem assistiu a sessão pode sentir o orgulho dos vereadores que propunham ao projeto. Mesmo aqueles que não são evangélicos fizeram questão de grifar sua religião durante o voto.

Costumo dizer que ninguém vaia Deus. Por isso sempre acho ruim quando um político usa o santo nome em seu discurso. Parece uma muleta narrativa ou um escudo para esconder seu despreparo. Ao vereador cabe a frieza de legislar com a razão, não com a fé. Mas a emoção cativa bem mais o eleitorado do que o juridiquês. Nessa promiscua relação, os artigos e parágrafos dão lugar aos capítulos e versículos.

Também costumo dizer que político não dá em árvore. Ele é cria da sua sociedade. Caso coopte todos os vereadores que seguem um pastor, a tal Bancada Evangélica será a mais expressiva da casa de leis. Dos 15 vereadores, 8 se identificam como sendo evangélicos. Os 7 restantes são católicos.

O censo do IBGE, do ano de 2010 (com incríveis 11 anos de defasagem), apontava que Sinop tinha 60% de católicos, 28,56% de evangélicos e 0,74% de espíritas. Os outros 11% se dividiam entre pessoas de outras correntes religiosas, sem religião ou descrentes.

Com o crescimento das chamadas igrejas neopetencostais – um fenômeno percebido em todo país – é bem provável que o número de evangélicos em Sinop hoje seja maior. Talvez bem próximo do percentual de católicos, que continua sendo a religião mais representativa por conseguir agrupar todos seus fies embaixo da abóboda da mesma igreja.

O Brasil culturalmente e constitucionalmente respeita a liberdade de credo. Com exceção à uma minoria fanática, quando alguém age de acordo com sua crença, não fazemos um enfrentamento. Apenas deixamos falar. Afinal, cada um com sua fé.

Mas o que acontece quando a fé começa a inferir sobre as leis de uma cidade ou de uma nação?

Sinop nunca teve a bancada da saúde, uma bancada da educação ou mesmo uma bancada do asfalto.

Agora temos uma bancada evangélica.

Que Deus vos proteja.

Jamerson Miléski

O Observador